terça-feira, abril 21, 2009

Querida Amiga Invisível

Não consigo lembrar seu nome. Mas quando era criança, eu tinha uma amiga imaginária. Talvez fosse fruto de uma infância sem irmãos, ou apenas uma coisa natural pra todo mundo. Minha amiga imaginária fazia tudo comigo. Brincávamos de boneca e de casinha. Era com ela que eu conversava quando minha mãe me colocava de castigo ou quando eu estava triste. Também era com minha amiga imaginária que bolava as melhores maneiras de enrolar meus pais para conseguir um brinquedo novo, ou permissão para algum passeio.
Ter uma amiga transparente e exclusivamente minha era divertido. De certa forma, olhando agora, ela completava os espaços mais solitários dos meus dias. Quando não estava na escola com meus colegas, estava em casa com meus brinquedos. E era lá, sentada no chão do quarto que a mágica acontecia. Lembro que eu chegava a perguntar para a minha amiga onipresente se era uma boa idéia fingir que a boneca iria ter um filho, ou se ela seria dona do escritório. Seria eu a professora ou a aluna na brincadeira? A gente decidia junto. Posso confessar até que muitas vezes era mais divertido ficar a tarde inteira com a minha amiga imaginária que passar algumas horas com algumas coleguinhas que bagunçavam e quebravam minhas coisas.
Essa minha amiga era também um pouco secreta. Nunca fui de pedir pra minha mãe deixar mais um lugar na mesa pra ela jantar com a gente, ou querer fazer festa de aniversário pra ela. O que eu tinha ali era muito mais confidente. Era como se eu pudesse trocar olhares com ela. E eu nunca ficava sozinha.
Minha amiga imaginária sabia tudo a meu respeito. Era pra ela que eu contava baixinho que estava apaixonada pelo menininho da minha sala ou que não tinha feito a lição de casa. Se brigasse com alguém na escola, era pra ela que eu contava em casa.
E quando descobri o que era sexo e percebi que meus pais também faziam isso, minha amiga secreta passou a ser mais confidente ainda. Era em tom de super segredo que eu sussurrava sozinha o quanto me incomodava saber que, por trás das portas do quarto, meus pais estavam transando. Mas, logo depois, eu e minha amiga secreta descobrimos que sexo era uma alguma coisa divertida de fato. Acho que alguns segredos que eu tive com essa antiga amiga ficarão com ela pra sempre.
Penso hoje se isso seria um caso de maluquice crônica, ou se é natural de toda criança. Minha amiga secreta tinha um nome e me dava conselhos e discutia comigo o que iríamos fazer.
O tempo passou, as complexidades da vida foram me envolvendo e não sei exatamente quando que minha amiga deixou de existir. A figura dela foi sumindo na minha cabeça e acho que eu não voltaria a pensar nisso, caso não houvessem me perguntado. Mas pensando agora, vejo como era rica essa minha fantasia, como me fazia bem. Será que era mesmo fantasia? Lógico que eu não pensava em nada disso na época. Era tudo natural, comum. Como qualquer amizade.
Agora percebo que, mesmo depois de adulta, continuo falando sozinha, discutindo minhas ações com alguém que não existe. Como se tivéssemos crescido juntas e vez por outra ela aparecesse pra tomar um chá e me dizer o que pensa a respeito das coisas que faço.
Não consigo lembrar o nome dela. Mas, assim como tantas outras pessoas que fizeram parte da minha vida e que se foram, fiquei com saudades

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